30 de jun. de 2022

Assistir a um filme de terror é menos traumático que assistir a uma comédia romântica

 

Hellraiser: o vilão Pinhead após sair da sua sessão de acupuntura

Assistir a um filme de comédia romântica com o seu par romântico requer algo que você nunca deu ao seu parceiro (a): atenção. O ato de assistir a um filme do gênero com o cônjuge requer uma série de procedimentos para evitar que, ao final, o silêncio não tome conta do carro quando vocês forem embora do cinema porque você não é tão romântico quanto o Ashton Kutcher. É primordial que você faça uma lista de datas e momentos importantes que vocês viveram, pois o filme vai exibir uma série de cenas que vai exigir que você esteja atento no momento em que seu parceiro (a) falar: lembra quando fizemos isso também? E este tipo de situação é algo que você não irá passar em uma sessão de filme de terror, onde apenas a extensão do seu ombro é necessária para abrigar a pessoa amada.

Você que não está acostumado a assistir filmes de terror, prepare-se para entrar em um universo onde o clichê não tem vez e, independentemente do filme que você escolher do gênero, sempre terá uma cidade pacata, um carro que vai enguiçar em uma noite chuvosa e uma loira com um poder de atuação igual ou levemente superior ao Neymar em La Casa de Papel.

A principal vantagem dos filmes de terror em relação aos demais gêneros é a representatividade que ele proporciona. Se você, mulher negra, está cansada de não enxergar nas comédias românticas, onde só os brancos amam, mulheres negras em papeis relevantes, nos filmes de terror essa representatividade existe e é cada vez mais presente. Neles é muito comum ver atrizes negras assumindo papéis de empregada, escrava e amiga barraqueira ou interesseira, sempre sendo dirigidas por um renomadíssimo diretor branco recém saído da faculdade.

Já uma característica que você vai encontrar nas comédias românticas, mas não nos filmes de terror, é a fofura dos protagonistas. O protagonista das películas de horror sempre é feio, asqueroso e tem um nome legal, como Leatherface, Jigsaw e Whindersson. E isso é digno de denúncia e investigação! Se o vilão se chamasse “Coelho Feliz” ou “Danadinho, o boneco da vovó”, certamente o número de casos envolvendo serial killer iria diminuir, porque ninguém ia querer ter um apelido tão feio e bobo estampado nos jornais.

À propósito, este é outro ponto que você leitor (a) precisa estar ciente: o boneco é uma entidade maligna. Não sei bem explicar o porquê, mas os autores de terror consideram este brinquedo um objeto assustador. Annabelle, Chucky e Maísa estão aí e não me deixam mentir. Você não verá um filme sobre sabonetes assassinos. O gênero, desde os tempos mais primórdios, proporciona essa alteração no senso comum em relação a personagens da nossa sociedade. Bonecos, freiras e meninas órfãs, que usualmente são associadas a imagens pacificas, ganham um aspecto pernicioso nos filmes do gênero. Os filmes de terror transformaram a experiência de ir à um orfanato, conversar com uma freira e adotar uma menina com uma boneca em uma experiência mais assustadora que assistir ao carnaval da Rede TV. 

Tais filmes costumam ditar quem será demonizado pela sociedade, recaindo sempre sobre nichos fragilizados. Confesso, como escritor, que fiquei preocupado quando assisti “Hush: A Morte Ouve” que diretores estivessem focados em colocar escritores como a próxima vítima dos psicopatas, como fizeram com jovens em férias e famílias que vivem à beira do lago. Mas esse sentimento logo passou quando, nos primeiros 15 minutos de filme, eu tive a certeza que ninguém iria conseguir assistir até o final. Se você curte o gênero e ainda não assistiu ao filme em questão, não perca tempo e vá correndo aprender a fazer slime ou jogar canastra com o seu avô, é muito mais produtivo.

Caso você não se sinta pronto para assistir filmes violentos, uma vertente dentro do terror que está ganhando popularidade é o terror-malhação, protagonizado por adolescentes e feito para adultos que têm Tik Tok e fazem testes no BuzzFeed. O filme IT: A Coisa e a série Stranger Things são exemplos de produções feitas para pessoas que querem assistir filme de terror e não sentir medo. É o mesmo que assistir um filme de comédia sem querer rir ou um filme erótico da Gretchen sem querer vomitar, não faz sentido.

Apesar dessa aparente dicotomia entre filmes românticos e de terror, ambos estão conectados pela riqueza em emoções transmitidas através de suas cenas. Figuras lendárias como Alfred Hitchcock e Woody Allen provaram inúmeras vezes que é possível fazer cinema de qualidade em ambos os gêneros e, com isso, alcançar seus principais objetivos em suas carreiras: serem citados por jovens que querem impressionar sem nunca ter assistido um filme sequer e acham que Vicky Cristina Barcelona é o mais novo single da Lady Gaga.

Portanto, caro (a) leitor (a), tenha ciência que o medo ao assistir tais películas é algo comum e inerente ao espectador. Um pensamento recorrente em um primeiro momento é imaginar que você será a próxima vítima. Por isso indico que você pare de assistir esses filmes de comédia romântica temáticos de casamento e migre logo – enquanto há tempo – para os filmes de terror.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Stranger Things: como explicar para alguém que nunca assistiu

  Eleven: não sei qual das três é ela O título é bem claro! Eu – que nunca assisti Stranger Things – vou ensinar você que assistiu a explica...

Os meus textos mais lidos por mim